na edição de hoje: uma música, um podcast e uma revista sobre e para apaixonados.
algumas semanas atrás, eu comprei um vaso lindo aqui pra casa. dias depois, recebi o email confirmando a entrega e, quando cheguei do trabalho, fui correndo pegar a encomenda no depósito do prédio. faz cinco meses que eu me mudei e, depois de um hiato de preguiça, eu criei coragem pra terminar de decorar a casa. ou, pelo menos, pra deixá-la mais preenchida.
aquele vaso e uma mesinha de café eram as primeiras peças desse movimento de retomada. mas, enquanto eu subia com as caixas no elevador, um barulhinho que vinha de dentro de uma delas indicava que algo estava errado. quando eu cheguei em casa, confirmei a suspeita: mesinha intacta e linda, e vaso quebrado. fiquei bem frustrada quando vi e pensei: “por que não colocaram aquela etiqueta enorme de ‘frágil’, pras pessoas terem cuidado ao lidar com a caixa?”.
um tempo depois, conversando com um amigo sobre se mostrar vulnerável, eu me lembrei do vaso quebrado e do meu desejo de etiquetar a fragilidade do objeto pro mundo ver. é tão simples quando é com uma coisa inanimada - ou com outro ser animado. no geral, a gente sabe as vantagens de se permitir ser vulnerável. não é garantia de nada, pode ser que você quebre também, no meio do caminho, mas costuma tornar a vivência mais leve. caso fosse socialmente aceito, você colocaria na sua testa (hipotético - escolha o lugar que quiser) uma etiqueta bem visível lembrando: “cuidado, frágil”?
eu fiz essa pergunta a mim mesma e a verdade é que admitir o óbvio dá um medo danado. não vou entrar aqui no mérito das origens dessa questão. há muitos pontos de vista a explorar: antropológico, sociológico, psicanalítico e por aí vai… fato é que não é fácil baixar a guarda, se expor e se submeter aos critérios alheios.
uma semana depois, eu devolvi o vaso quebrado porque aqui nesse país nada se perde, tudo se devolve. e me lembrei de uma frase que eu conheci na adolescência e me encantou instantaneamente:
“There’s a crack in everything, that’s how the light gets in.”
“Há uma rachadura em tudo, é assim que a luz entra.”
muitos anos depois - obrigada internet! - eu descobri que era um verso da música Anthem, de Leonard Cohen. vale fazer uma pausa pra ouvir a versão abaixo:
não existe perfeição e mesmo assim é difícil falar sobre o que dá errado. eu mesma sempre quero escrever mais aqui sobre as minhas dificuldades, meus fracassos, mas ainda esbarro em vários entraves. digo a mim mesma que algumas fragilidades são bobas ou, então, que não preciso me expor. mas o que eu faço aqui o tempo todo senão falar sobre trivilidades e expor minha vida?
esse texto estava todo “escrito” em áudios quando eu parei pra ouvir mais um podcast de entrevista com a Samantha Almeida, uma profissional que eu admiro, e a quem eu sempre presto atenção quando fala. ela é diretora de Marketing da TV Globo e apareceu por aqui na primeira edição. eu vejo semelhanças nas nossas trajetórias de vida e de trabalho, e me identifico com a forma dela de ver o mundo e de entender o papel dela na sociedade.
nesse podcast, ela fala sobre muitos assuntos, em mais de uma hora e meia de papo e aprendizado. um dos temas sobre o qual a Samantha fala de forma muito honesta é exatamente vulnerabilidade.
o relato dela encontrou minhas ideias em gestação e me fez acessar um detalhe que eu ainda não tinha alcançado sozinha sobre ser vulnerável. a Samantha lembrou uma situação profissional muito difícil que ela viveu e, sem romantizar, revelou como aquela experiência a fez reforçar os valores e crenças que orientam a carreira dela. não é uma história piegas com lição de moral e pitadas de superação, é um convite a aceitar as fragilidades e se preparar pra lidar com elas do jeito possível. veja: não é o melhor jeito possível, necessariamente. é fundamentalmente o jeito possível, aquele que a gente dá conta, que cabe na nossa bagagem, que é o bastante mesmo que tenha uma rachadura aqui ou outra ali.
ouvir a Samantha foi inspirador, me ajudou a lembrar que eu sou frágil, apesar da ausência de etiqueta, mas também que eu sei carregar minha caixa com muito cuidado. agora, mais do nunca. morar sozinha em Nova York, longe das pessoas que eu amo, me impôs a obrigação de não perder de vista a importância de estar presente pra mim mesma.
inspiração da edição
“a vida não é perfeita, histórias de sucesso não são perfeitas. e é nisso que a beleza pode ser encontrada. no atrito, no aprendizado com os erros, nas diferenças, nas mudanças de rota, no inesperado, falhando e se reerguendo. as jornadas são o que fazem as histórias nessa revista bonitas.”
A passion thing é uma revista bianual sobre pessoas motivadas pela paixão, que “redefiniram o sucesso”. calma, não é uma publicação com pegada coach, que vai dizer pra você trabalhar com o que ama e nunca mais precisar trabalhar. é o contrário disso. a revista conta histórias de profissionais inspiradores que são apaixonados pelo que fazem, mas que são mais do que apenas o que fazem, são pessoas interessantes.
eu comprei a edição número 8, dois meses atrás, porque me apaixonei (rs) pelo título e pela capa, com a foto de um homem de terno entre lápides. o homem é Lok Chung, diretor de funerais em Hong Kong. ele entrou para o negócio da família, nos moldes bem tradicionais, e, aos poucos, foi iniciando um movimento de transformação da cultura de funerais na China. hoje, tem a própria funerária e trabalha pra promover mudanças na forma como a morte é encarada pela sociedade. a entrevista é instigante, daquelas que te fazem querer ir atrás de mais informação.
a revista tem um site muito bacana, que está linkado ali em cima e dá uma boa ideia de como as editoras Sandra Reichl e Karin Novozamsky têm um olhar curioso e sabem fazer uma curadoria afiada de personagens diferentes e interessantíssimos do mundo todo. dá pra comprar a edição impressa pela internet, mas não é barata, já aviso logo. quer explorar essa dica sem gastar? clica nos links todos que eu marquei e segue o perfil da revista no instagram.
pra terminar, uma foto bonita do vaso quebrado pra lembrar que há muita beleza nas imperfeições. esteja atento pra ver!
obrigada pela companhia. enquanto a próxima edição não chega, nós podemos conversar lá em @vivi_dacosta. é onde eu compartilho mais sobre as minhas inspirações, a vida e as oportunidades que eu observo por aí. aguardo suas opiniões e sugestões.
Sempre necessária você, Vivi!!! Eu estou tentando aprender a aceitar as minhas vulnerabilidades, mas, para além de aceitá-las, acolhê-las! E devo muito disso a você, que me indicou podcasts de mulheres maravilhosas (que o Thiago diz que eu mudei, desde que passei a ouvir podcast de mulher de "sovaco cabeludo" - não, não é uma fala pejorativa...é só uma brincadeira entre mãe e filho, pra definir mulheres que se posicionam perante os "machos" da espécie kkkk). Minha psicóloga me disse isso outro dia: que eu não preciso minimizar as minhas dores, porque alguém no mundo tá sofrendo mais que eu... É... é verdade! Eu não me permitia sentir minhas dores e fragilidades, porque, por exemplo, alguém que perdeu tudo tinha mais direito que eu! Mas é difícil se colocar essa etiqueta! De frágil... Porque a gente aceitou o rótulo de forte e não cumprir esse papel é demonstrar uma fraqueza, uma incompetência... Como assim vc não consegue?! Erroneamente, principalmente, nós, mulheres, somos ensinadas desde cedo a "sermos fortes", a dar conta de tudo, a fazer o jantar com o filho no colo, enquanto fala ao telefone com alguém e ao mesmo tempo ensina o trabalhinho da escola ao outro filho etc. Enquanto o homem, "coitado", não sobrevive a uma gripe... Afff! A gente precisa parar e gritar qd a carga estiver pesada, qd estiver doendo, qd não estiver cabendo... porque a gente não dá conta, mas quer ser a heroína que salva o dia (ou o almoço)... as gripes também nos derrubam... a vida tb nos dá rasteiras! Não quero dizer que tenhamos de performar de vítimas, mas a gente tem nossos calos apertados, nos sapatos que nos disseram um dia que tínhamos de usar, pra sermos mais bonitas! Aceitar a etiqueta de "cuidado, frágil" é libertador! Porque é assim que "a luz entra" nos cantinhos mais escuros e doídos da alma! Obrigada por ser aquela que, mesmo frágil, provoca rupturas... inclusive, de paradigmas! <3 ;)
Sou aquela pessoa que não ouve podcast. Mas decidi ouvir os conselhos de Vivi e hoje fui apresentada a Samantha Almeida. Obriagada pela generosidade de trazer as falas dessa mulher aos meus ouvidos nessa segunda-feira de sol. Ser imigrante brasileira é ser um corpo dissidente em terras portuguesas quando todos de olham como a pessoa racializada inferior. Estou aqui pensando sobre o ter noção de nossas histórias e o convite a abandonar a síndrome da impostora. Sempre me senti meio impostora, mas nunca fui mt boa em nada, mas entrego muito quando preciso. As vezes sinto que me falta paixão, noutras vezes sinto que é medo de crescer. Ser pequena é confortável. é mesmo? tô aqui, refletindo tudo isso por suas palavras. Qual a diferença da fragilidade e da vulnerabilidade? Uma pessoa frágil parece que quebra a toa, e todo mundo tem que tomar cuidade, mas talvez seja só uma fase quebrada. "Oi, estou quebrada pq desenraizei. Pq minha familia esta do outro lado do oceano. Pq foi aniversário da minha irmã e eu não estava lá pra abraça-la". E a vulnerabilidade? é escolha? A Samantha disse que as vezes ela escolhe não se vulnerabilisar em alguns espaços, mas a vulnerabilidade a encontra. Talvez ela chegue sem avisar pra puxar a nossa orelha, e lembrar que é pelas frestas que a luz entra. Obrigada mais uma vez ser uma voz que abraça